Se você, caro leitor, gostar deste blog, indique-o a amigos. Boa leitura!

.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Clóvis, O Chato

Noite destas, minha casa estava num silêncio só. Filhos brincando em algum canto, patroa na faculdade e eu numa poltrona com a cara enfiada num livro.
De repente, ouço um acorde musical, ou quase isso. Levanto e vou atrás do som. Meu Yamaha foi ligado. Encontro Dilbert, meu ferret - ou furão -  trepado, pisoteando meu teclado. Balançou o rabo e agitou o focinho, como se estivesse fazendo alguma coisa muito divertida. Pisou numa “Ré de oitava” e me olhou. Afundou uma “Fá” prolongando a nota e me olhou de novo. Com duas patinhas conseguiu uma “Mi sustenido”, pisando na preta e na branca ao mesmo tempo, sempre me fitando com ares de Mozart. Peguei-o no colo e pus no chão. Reparei no teclado um pouco empoeirado. Faz tempo que não toco. Resolvi exercitar um pouco de Vinícius, um bocadinho de Tom; experimentei uma Ella Fitzgerald e fui para “I see trees of green”, quando tocou o interfone:
- Seu André, boa noite. A música está vindo do seu apartamento?
- Ai, desculpe, nem percebi que já passam das 10.
- Sou o Clóvis, do 81.
- Perdão, vizinho, não pretendia incomodar – respondi sem graça.
- Não, não, está lindo. Até abri um vinho. Dá bem para ouvir daqui. Sabe, estou casando minha filha...
- Parabéns, mas, então...
- O senhor poderia tocar no casamento dela...
- Eu, o quê?
- Poderia tocar na igreja. Posso pagar bem.
- Ah, não sou músico.
- Adoro modéstia!
- Obrigado, senhor...senhor...
- Clóvis, e pode me chamar de você.
- Então, Clóvis, nunca toquei em festas.
- Sempre tem a primeira vez, parceiro. Tô com um orçamento de 3 paus. Consegue bater esse preço?
- Clóvis, tocar é um mero lazer meu.
- Já sei, aposto que cobra o dobro, né?
- Mas estou dizendo que não sou músico.
- Claro que é! Só músico toca assim.
- Imagine...
- Achou pouca a minha oferta. E se eu melhorar?
- Não...não...
- 4 paus!
- Eu não...
- Sabe negociar, hein?
- Eu não...
- Ah, por favor...
- Clóvis, é o seguinte: cobro 50 mil.
- O quê?
- Isso mesmo! Sou músico, sou famoso e cobro 50 mil, entendeu?
- Pô, aí não dá pra mim.
- Então, boa noite, Clóvis.
- Boa noite seu André.
Morar em prédio é um saco!